Sancionada pelo governador Helder Barbalho e publicada no Diário Oficial do Estado do Pará nesta segunda-feira (29), a Lei da Política Estadual de Proteção dos Direitos das Pessoas com Transtornos Mentais e Sofrimento Psíquico entra em vigor com foco em viabilizar um melhor atendimento a cidadãos com essas características. Trata-se da Lei nº 9.933, de 26 de maio de 2023, que estabelece diretrizes para a consecução dessa política estadual.
“Os direitos e a proteção das pessoas com transtorno mental, de que trata esta Lei, consubstanciados nos princípios constitucionais que regem os direitos individuais, coletivos e sociais, e em consonância com a legislação e as normatizações do Sistema Único de Saúde e da Lei Federal no 10.216, de 2001, serão assegurados sem qualquer forma de discriminação quanto à raça, cor, sexo, orientação sexual, religião, opção política, nacionalidade, idade, família, recursos econômicos e ao grau de gravidade ou tempo de
evolução de seu transtorno, ou qualquer outra, é previsto na nova legislação.
Para Jureuda Guerra, presidente do Conselho Regional de Psicologia do Pará, a lei “era uma necessidade”, era um anseio da população, porque “só existia a lei federal, a 10.216, de 2001; somente após 22 anos é aprovada uma lei em caráter estadual”. “Qual a necessidade dessa lei? Criar políticas públicas, entrar no PPA (Plano Plurianual) a saúde mental, ampliar o recurso da saúde mental para os vários municípios do Estado, criar uma regra para o serviço, então, os detalhes da lei eles são necessários”. Jureuda questiona que a lei estadual prevê serviços de internação, mas no cômputo geral avalia que a legislação pode contribuir para viabilizar ações reais em prol da saúde mental no Estado.
Direitos
No artigo 3º da Lei nº nº 9.933, são considerados direitos das pessoas com transtorno mental de acordo com a Lei Federal no 10.216 de 2001: ter acesso ao melhor tratamento do sistema de saúde, consentâneo às suas necessidades; ser tratada com humanidade e respeito e no interesse exclusivo de beneficiar sua saúde, visando alcançar sua recuperação pela inserção na família, no trabalho e na comunidade; ser protegida contra qualquer forma de abuso e exploração; ter garantia de sigilo nas informações prestadas.
Outros direitos previstos são: ter direito à presença médica, em qualquer tempo, para esclarecer a necessidade ou não de sua hospitalização involuntária; ter livre acesso aos meios de comunicação disponíveis; receber o maior número de informações a respeito de sua doença e de seu tratamento; ser tratada em ambiente terapêutico pelos meios menos invasivos possíveis; ser tratada, preferencialmente, em serviços comunitários de saúde mental.
Rede de atenção
Art. 4o Para assegurar a promoção, a prevenção, o tratamento e a reabilitação da pessoa em sofrimento psíquico e seus familiares, garantindo-lhes o acesso ao trabalho, à convivência em comunidade e o direito ao lazer, o Poder Executivo, por meio de seus órgãos competentes, em seus respectivos níveis de atribuição, deverá promover a instalação, a manutenção e o funcionamento da rede de atenção intersetorial por intermédio de dispositivos substitutivos ao modelo manicomial.
Esses dispositivos substitutivos, previstos na lei, abrangem: equipamentos de Atenção Básica em Saúde como Unidades Básicas de Saúde e Consultório de Rua; centros de Atenção Psicossocial; emergências psiquiátricas nos prontos-socorros gerais; leitos ou enfermarias de internação psiquiátrica em Hospitais-Gerais; leitos ou unidades de internação psiquiátrica em Hospitais-Gerais; serviços especializados em regime de Hospital-Dia; centros de convivência e cooperativa; serviços residenciais terapêuticos; unidades de acolhimentos temporários; serviços de qualificação profissional e fomento à economia solidária; centros de referência da assistência social; mecanismos de controle social das políticas públicas; benefícios de acesso gratuito aos sistemas de transportes públicos; benefícios de acesso gratuito aos sistemas de cultura e lazer; benefício de prestação continuada; programa de volta para casa-auxílio de reabilitação psicossocial; programas de habitação e moradia; serviços de acompanhante terapêutico e redução de danos.
Procedimentos terapêuticos
O Poder Executivo garantirá que os contratos com instituições ou estabelecimentos privados ou filantrópicos de tratamento psiquiátrico só deverão ser mantidos sob condição contratual de inclusão e obediência ao disposto nesta Lei.
De acordo com o artigo 5º da Lei 9.933, toda pessoa com transtorno mental ou sofrimento psíquico terá direito a ambiente com restrições amparadas em procedimentos terapêuticos cujos objetivos sejam voltados para a integralidade física e mental, da identidade e dignidade da vida familiar, comunitária e do trabalho baseados num plano prescrito por profissionais habilitados por instituições de reconhecimento público, com a participação do examinado e seus familiares, e administrados após seu consentimento informado.
Segundo o artigo 6º, o Poder Executivo deverá proibir em qualquer estabelecimento público ou privado “o uso de procedimentos que não obedeçam às normas vigentes de consenso clínico científico e outros usados em diferentes momentos históricos em instituições de confinamento, como celas-fortes, camisas de força, psicocirurgia, esterilização e qualquer outro procedimento violento e desumano para fins de tratamento de transtornos mentais, sob pena de responsabilização do infrator”.
Medicação
O uso de medicação nos tratamentos de pessoas com transtorno mental e/ou sofrimento psíquico deverá responder às necessidades fundamentais de saúde das pessoas e terá finalidade exclusivamente terapêutica, dentro de consenso clínico, pelos termos de referência estabelecidos pela comunidade profissional reconhecidas por lei, devendo ser avaliado e reavaliado periodicamente com o conhecimento do usuário e/ou seus familiares.
A restrição ou imobilização dos movimentos da pessoa com transtorno mental e/ou sofrimento psíquico será utilizada como recurso terapêutico e, no menor tempo possível, pautado por procedimentos de consenso da comunidade de profissionais da área, após o esgotamento de todas as outras formas e possibilidades terapêuticas prévias, e deverá objetivar a mais breve recuperação, suficiente para determinar a imediata ressocialização das pessoas com transtorno mental e sofrimento psíquico, realizando-se sob regime terapêutico institucional.
Internação
O Poder Executivo garantirá que a internação psiquiátrica, nos termos deste artigo, deverá ter encaminhamento exclusivo dos serviços de emergências psiquiátricas dos prontos-socorros gerais, de outros serviços de referência de saúde mental e ocorrer, preferencialmente, em leitos de saúde mental dos CAPS com funcionamento 24 horas e em leitos/enfermarias de hospitais gerais de acordo com o que estebelece o art.6o, incisos I, II e III da Lei Federal no 10.216/2001.
As internações psiquiátricas deverão ser por breves períodos de tempo, o suficiente para a remissão dos sintomas que conferem risco ao indivíduo e seus pares, sendo proibida estender a permanência em ambiente hospitalar para além da alta médica.
As equipes de saúde e assistência social por meio de planos construídos intersetorialmente deverão trabalhar nas questões sociais envolvidas no caso a fim de garantir autonomia social e econômica aos usuários.
Sem segregação
A Lei nº 9.933 estabelece que o Poder Executivo deverá vedar a criação e o funcionamento de espaços físicos ou serviços especializados que impliquem em segregação das pessoas em sofrimento psíquico em quaisquer estabelecimentos de saúde, assistência social e educacionais, públicos ou privados, garantindo sempre que necessário, o acesso à rede de saúde, de assistência e de ensino, em qualquer faixa etária, com a retaguarda existencial e de apoio integrada à prevenção, tratamento ou reabilitação.
Esta Lei aplica-se a todos os estabelecimentos públicos ou privados, seus profissionais e demais trabalhadores, incluindo aqueles ligados à atividade autônoma, que promovam o tratamento de pessoas em sofrimento psíquico, ou que de alguma forma estejam ligados à prevenção, tratamento ou reabilitação dessas pessoas. O Poder Executivo deverá garantir que todo estabelecimento de saúde fixe esta Lei em lugar visível aos usuários dos serviços.
Fonte: Pará – O Liberal.com