Na sessão realizada na Assembleia Legislativa do Pará (Alepa), nesta quinta-feira (10), para debater a violência e aspectos da saúde mental nas escolas, a professora de Português, Mariclea Marinho, da Escola Estadual Palmira Gabriel, bairro Tenoné, em Belém, onde há mais de um mês em estudante esfaqueou um colega no estabelecimento, disse que o caso indica a complexidade do tema abordado. Isso porque, como revelou a educadora, o aluno teve uma crise “de chorar e se tremer todo” durante uma atividade escolar sobre violência contra a mulher, uma semana antes de cometer o ato infracional. “Ele precisou perder a liberdade para ter direito ao atendimento psicológico e de assistência social”, disse ela sobre o jovem internado no Centro de Internação do Adolescente Masculino (CIAM).
A sessão especial requerida pelos deputados estaduais Lívia Duarte (PSOL), Carlos Bordalo (PT) e Maria do Carmo (PT) reuniu representantes do governo do estado do Pará e da Prefeitura de Belém, como o secretário estadual de Igualdade Racial e Direitos Humanos, Jarbas Vasconcelos; ouvidor geral do estado, André Bassalo; e a secretária municipal de Educação Araceli Lemos; além de representantes dos sindicatos e conselhos de trabalhadores da educação, assistência social e da psicologia, representantes do Tribunal de Justiça do Estado do Pará (TJPA), Defensoria Pública do Estado e Universidade Federal do Pará (UFPA), entre outros.
Violência chega até a escola
“Foi algo muito complexo que assustou a todos, tanto quem está dentro da escola como quem está fora”, disse a professora Maricleia, que também é psicóloga. “Quando a gente encontra situações (de alunos abalados) a gente não encontra apoio. O menino (autor) era um bom aluno, que você nunca iria apontar como problemático, ele gostava de ler, tinha relação com os meninos”, recorda. Ainda segundo ela, a escola ficou três semanas sem aula porque todos estavam abalados e, na semana seguinte, quando as aulas foram retomadas, houve um acolhimento com a comunidade escolar com abordagem da saúde mental.
“A violência não está só na escola, ela vem de fora. É importante que todos os setores se unam em torno desse tema, a educação, a justiça, a segurança, a saúde para ver se a gente consegue dar mais segurança aos alunos, do ponto de vista físico e do acolhimento, e também da saúde mental e educacional”, enfatizou a professora Mariclea. Ela contou que o aluno ferido já se recuperou e voltou para a escola, onde foi recebido com festa pelos alunos e professores.
Espaço social
A deputada Lívia Duarte, que elaborou o requerimento da sessão, disse que os representantes da população têm a obrigação de discutir a segurança nas escolas. “A escola é um pequeno espaço social no qual a criança apresenta o que ela aprende em casa ou em outros espaços”, observou.
“A discussão é muito ampla e vai para além da militarização e da segurança na porta da escola. Tivemos a explanação dos novos protocolos adotados pelas secretarias de educação estadual e municipal, como o aplicativo ‘Guardiões', desenvolvido pela UFPA para a Secretaria Municipal de Educação (Semec) monitorar os casos de covid-19 nas escolas, e, que, agora, está servindo para monitorar a segurança nas unidades de ensino, mas com a força de trabalho integrada dos órgãos da prefeitura e do estado. Os representantes de outros coletivos estão aqui para conhecer e também para opinar sobre esses protocolos”, disse a deputada Lívia Duarte.
Problema de todos
O deputado Carlos Bordalo ressaltou que o problema da violência nas escolas “é de todos nós da sociedade”. “Agora, é muito importante medidas urgentes que transmitam segurança, mas isso não vai resolver o problema da saúde mental que, infelizmente, está divorciada de muitas políticas públicas. Acabamos de aprovar na Alepa a Lei Estadual de Política Estadual em Saúde Mental, esta semana. Estou propondo que o governo do estado instale nas Usinas da Paz os Centros de Apoio em Assistência Social (Caps) porque, se nós oferecermos nos territórios as alternativas para que essas crises possam ser trabalhadas, com certeza, não estourarão na escola”, recomendou.
A secretária Araceli Lemos detalhou que o Guardiões possibilitam que um representante de cada escola acione diretamente a sede da Semec e a Guarda Municipal de Belém, que, por sua vez, acionam a rede de atendimento envolvendo vários órgãos, para cuidar de qualquer situação que fuja da normalidade dentro das escolas.
“O problema não está só na escola, mas na sociedade. Todos nós, especialmente o poder público, precisamos encarar isso com seriedade. Uma das formas de enfrentar isso é fomentar uma educação de forma integral, com escolas bem cuidadas, equipadas e com uma educação que seja sem preconceitos raciais, misóginos e contra os LGBTQIA+, que estimule a convivência com o diferente e que fomente a cultura de paz”.
Identificação de demandas
Já a tenente-coronel Simone Chagas, comandante do Policiamento Escolar da Polícia Militar do estado, disse que o recém-criado batalhão tem o objetivo de identificar as demandas de violência nas escolas. “Temos feito um trabalho preventivo pelo Programa Escola Segura aproximando as nossas atividades com palestras para construir juntos com a comunidade escolar o plano de segurança escolar com protocolos de segurança, atuando na prevenção, orientando sobre como agir em situações de crise no ambiente escolar, e, principalmente e padronizar os procedimentos”, destacou.
“A segurança pública não se faz em polícia e nem somente só com a polícia”, observou Simone Chagas. Ela mencionou a rede de proteção constituída com os diversos órgãos que realizam diferentes abordagens, incluindo a saúde mental.
Condições
Coordenadora do Sindicato dos Trabalhadores da Educação Pública do Pará (Sintepp), Conceição Holanda ressaltou que a entidade vem denunciando a conjuntura de violência pela qual a escola pública passa. Ela disse que o cenário também é influenciado pelas condições dos estabelecimentos de ensino, como calor, falta de merenda escolar e de funcionários, além de assédio moral.
“Se a gente não trata essas questões, não qualifica a escola colocando profissionais capacitados que possam atender os conflitos que existem na escola, ela será violenta. A gente quer poder contribuir. Policial armado não vai acabar com a violência. A gente representa uma categoria que acompanha o dia a dia na escola e tem a contribuir para essa discussão, mas é a primeira vez que a gente trata do tema junto com as autoridades”, salientou Conceição Holanda.
Fonte: Pará – O Liberal.com