Não são só os filmes do Oscar que criam multiversos
onde diversas versões de um mesmo personagem podem estar vivendo suas próprias
histórias em universos paralelos. A atual novela das 19h, “Vai na Fé”
(Globo), aponta na mesma direção ao citar novelas de diferentes décadas em meio
à trama da atriz decadente Wilma, vivida por Renata Sorrah.
No mundo criado por Rosane Svartman para a novela,
não foi Susana Vieira quem interpretou a babá Nice na primeira versão de
“Anjo Mau” (1976). Nem José Wilker (1944-2014) quem fez o papel de
Rodrigo nesse folhetim. Os personagens foram vividos por Wilma e Fábio (Zé
Carlos Machado), que depois se tornou marido dela. Mas as menções a outras
tramas não param por aí.
Em três meses de exibição, os espectadores já se
divertiram, por exemplo, com a atriz frustrada perdendo um papel para
Christiane Torloni, que fez uma participação especial, ou reproduzindo a
icônica fala “Me serve, vadia!” de “Avenida Brasil” (2012).
“Adriana Esteves roubou o meu papel em ‘Avenida Brasil', mas você vai ver
como eu seria uma ótima Carminha”, explica Wilma antes de tomar seu dry
martini cenográfico.”Adriana Esteves… roubou meu papel em Avenida Brasil… Você vai ver como eu seria uma ótima Carminha…” “Prontinho, dona Wilma.””ENTÃO ME SERVE, VADIA!” Um crossover memorável desse com uma Renata Sorrah em estado de graça. #VainaFé pic.twitter.com/gszdqLamEi— Sérgio Santos (@ZAMENZA) March 12, 2023
À reportagem, a autora conta que a ideia de inserir
essas cenas partiram de sua vontade de honrar outras tramas. “Na verdade,
eu acredito e celebro muito a telenovela”, diz Svartman, que fez doutorado
no tema. “A Wilma circulou nas mídias anteriores à teledramaturgia, e esse
meu mergulho na história da telenovela e da TV me deram a vontade de fazer essa
homenagem.”
Esse carinho pelo gênero acaba funcionando como um
afago para os fãs. Para Claudino Mayer, doutor e pesquisador em teledramaturgia
e professor da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT) do curso de cinema e
audiovisual, até a escolha por Renata Sorrah para o papel foi acertada nesse
sentido.
“A Rosane tem depositado as referências na
personagem da Renata, porque ela é top das tops, uma das mais importantes da
nossa dramaturgia”, lembra. “E o mais importante, não é forçado, faz
completamente parte da história dela, e todos conseguem reconhecer e
aprovar.”
Apesar de Sorrah ter atuado em parte das novelas
referenciadas, há uma preocupação da autora e de sua equipe em deixar tudo bem
delimitado. “A Renata e a Wilma, apesar de terem muitas coisas em comum,
não são a mesma pessoa”, reforça Svartman.a wilma falando de laços de familia, e dizendo que a @caroladieck roubou o papel dela de camila KKKKKKKKKK eu amo!!!! #vainafé pic.twitter.com/yVmIyhvtnE— gabizinha 🍀 (@dieckmxnn) February 22, 2023
REFERÊNCIAS
Uma das citações mais recentes de “Vai na
Fé” foi a “Vale Tudo” (1988-1989), trama de Gilberto Braga na
qual a própria Renata Sorrah interpretou Heleninha, a filha alcoólatra de Odete
Roitman (Beatriz Segall). “Eu queria ter vivido a Maria de Fátima ou a
Odete”, brinca Wilma, em cena.Essa cena icônica de ‘Vale Tudo' da Raquel rasgando o vestido da Fátima, com Wilma Campos e Érika! #VaiNaFé pic.twitter.com/hWB7GRvHVh— TV Globo 📺 (@tvglobo) April 11, 2023
A dupla referência tanto ao passado da atriz quando
ao da personagem, faz a novela assumir outro status, na opinião de Mayer.
“O público gosta de repetição, tanto de personagens quanto de falas,
porque gera familiaridade”, afirma o especialista. “A vida é uma
eterna repetição que, se não tiver, a gente estranha.”
A autoria diz que tenta trazer apenas alusões que
façam sentido com sua história, contando para isso com uma equipe de escritores
e pesquisadores. “As novelas vão se encaixando, e muitas vezes peço ajuda
da [pesquisadora] Paula [Teixeira] com coisas específicas, como: ‘Vamos buscar
uma cena de traição'”, exemplifica Svartman.
“Não basta ser qualquer novela, tem que ser
uma que converse com a cena em uma intertextualidade de novelas que tenham o
mesmo significado”, confirma Teixeira. A lista de referenciados, até aqui,
já conta com autores como Silvio de Abreu, Gilberto Braga e Gloria Perez.A Wilma citando Glória Perez e falando q teria feito uma linda Jade em #OClone, mas acharam ela muito velha pro papel e só sobrou fazer uma das muitas esposas do tio Ali q ficava de véu o tempo todo e mesmo assim ela arrasou #VaiNaFé pic.twitter.com/6G8NBD92je— gatinho 𓃠 (@gatinhosexy__) January 18, 2023
Para Mayer, no entanto, outros nomes que fizeram
parte da história das novelas poderiam ser lembrados no multiverso criado pela
autora ele apostaria em Janete Clair e Ivani Ribeiro. “O espectador vai
cair no papo e ser ainda mais conquistado por ele”, avalia.
Fonte: DOL – Diário Online – Portal de NotÍcias